Montag, 31. August 2009

Fé e Cidadania

Fé e Cidadania
Heinz F. Dressel
Editora UNIJUÍ
Ijuí-RS 2006
Catalogação na Publicação:
Bibliotéca Universitária
Mario Osorio Marques - Unijuí
1. Cidadania 2. Sociologia 3. Religião 4. Reforma Agrária
5..Ciências sociais 6. Língua portuguesa, história da
7. Política 8. Cultura 9. Economia

Seguem aqui uns parágrafos de textos do livro Fé e Cidadania que publiquei no ano de 2006 na Editora Unijuí. O livro foi gentilmente apresentado pelo professor Dr. Walter Frantz. Segue aqui - como introdução de meus textos - a principal parte do teor da introdução do amigo Walter, um dos pioneiros no contexto da fundação da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí).

Apresentação

O escritor sempre revela algo de sua vida por meio das palavras e conteúdos de seus textos, mesmo que não fale de si, diretamente ... O leitor pode encontrar-se com o autor em todos os seus textos, que revelam os lugares sociais de vida do autor. O autor tem uma história de vida marcada pela experiência das relações internacionais, pela convivência com diversas culturas de diferentes países. Dessa valiosa experiência de vida nascem as razões e as motivações de seus escritos.

No início da década de 50 do século XX, o jovem pastor Heinz Friedrich Dressel e sua esposa, a nutricionista Ilse Dressel, chegam ao Brasil, vindos da Alemanha, para dedicar-se a trabalhos de pastoral na região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Desde 1952, trabalhando em diferentes comunidades, na região e no Estado, na condição de pastor, desenvolveu uma relação pessoal forte com o Brasil, revelada e testemunhada por muitos de seus textos, os quais ultrapassam a sua missão específica de pastor. Fez-se brasileiro de sul a norte, sempre criando e estabelecendo muitos laços de amizade. Sentindo-se e fazendo-se brasileiro, pelo trabalho e pela cultura, passou a escrever sobre a sociedade brasileira. Desse modo, em muito tem contribuído para com as relações de cooperação e amizade entre os dois povos. Em 1968, retornou a sua terra natal, porém passou a amar o Brasil e o Rio Grande do Sul, retornando sempre que possível, inclusive pela publicação de livros. Uma de suas pontes entre as duas culturas e pelas quais viaja, seguidamente, são suas pesquisas, seus escritos, sobre temas da realidade brasileira.

A sua relação com o Brasil, porém, foi reforçada pelo exercício da função de diretor da Obra Ecumênica de Estudos ÖSW - Õkumenisches Studienwerk e.V. de Bochum, Alemanha), durante um período de 20 anos, de 1972 até 1992. Nesta função, além do importante papel de apoio à formação de muitos mestres e doutores para universidades brasileiras e latino-americanas, o pastor Dressel exerceu também um papel importante, à época, no socorro aos perseguidos políticos.

Com o agravamento da opressão política no Brasil e em muitos outros países dos continentes de origem dos parceiros da Obra Ecumênica de Estudos, esta decidiu acolher perseguidos ou exilados políticos, articulando política e ajuda ao desenvolvimento. Muitos exilados brasileiros, latino-americanos, africanos e asiáticos tiveram a sorte do apoio da Obra Ecumênica de Estudos e puderam, além da liberdade, usufruir da oportunidade de uma formação e qualificação em universidades alemãs e de outros países da Europa. Na condição de responsável pela Obra Ecumênica, o pastor Dressel conseguiu estender ajuda a muitas pessoas perseguidas, politicamente, em diferentes países. Sempre reuniu coragem e forças para lutar pelos direitos humanos, onde quer que estivessem sendo desrespeitados. Sempre que necessário, foi aos lugares e às pessoas envolvidas.

Aqui está uma marca especial de atuação e da personalidade do pastor Dressel. Como humanista e cristão, empenhou-se para a abertura das portas da Obra Ecumênica de Estudos também para quem estivesse em apuros por razões políticas, sem distinção de credo ou convicções ideológicas. Tinha como bandeiras o reconhecimento do direito às diferenças e o respeito à liberdade. Com este objetivo viajou, pelos diferentes continentes e países, em busca da afirmação da liberdade de pensamento e de organização. Com coragem e determinação, aliou a defesa intransigente dos direitos humanos à política de ajuda ao desenvolvimento, à concessão de apoio à formação docente. Assumiu e desempenhou, pode-se dizer, desse modo, uma função de pastor de um rebanho de ovelhas perseguidas, em diferentes países e continentes, incentivando-as a se abrigarem nas universidades, em seus programas de estudo, superando, sempre que possível, os traumas do exílio. Vislumbrou oportunidades de futuro em meio às dificuldades. Soube olhar em direções múltiplas, respeitando o diverso e lutando pela liberdade onde ela estivesse em falta. Com sua atitude solidária e corajosa, penetrou fundo na alma de todos aqueles que puderam conviver com ele. Marcou vidas, ao abrir caminhos e indicar horizontes.

Os seus escritos, os seus livros, os seus artigos, os seus relatórios de viagem, as suas cartas, as suas visitas, o seu esforço incansável em defesa dos direitos humanos, trazem o exemplo e o compromisso com aquilo que tanto se sonha construir: a liberdade e a justiça social, em toda a dimensão possível e necessária para que o ser humano se complete em seus direitos e deveres.

Não poderia deixar de fazer referência, ainda que mínima, a uma passagem da história do ensino superior brasileiro.

No Brasil, seja por dificuldades econômico-financeiras, seja por opção política ou mesmo por omissão, por parte do poder público, em muitos espaços sociais e geográficos da sociedade brasileira, surgiram diferentes iniciativas não-estatais, apoiadas no marco jurídico constitucional e legal, com a função de promover a educação universitária. Dentre essas iniciativas, nasceu e se estruturou uma organização nova, nova em sua natureza, contendo novas forças e novos significados sociais. Nasceu e se desenvolveu a universidade comunitária e regional, experiência fundante de uma natureza pública não-estatal.

Essa experiência inovadora no cenário acadêmico brasileiro, contudo, nem sempre encontrou facilidades. No passado, especialmente, deparou-se com dificuldades politicas, somadas aos obstáculos materiais e financeiros. À coragem e à ousadia de se instituir uma universidade, somou-se o constrangimento político, alimentado pelo medo do diverso, do confronto de argumentos, sustentado pelo poder das estruturas tradicionais da economia e da política.

Conforme depoimento do professor Argemiro Jacob Brum,

A Fidene, fiel a sua trajetória histórica e ao seu projeto, rejeitava submeter-se aos ditames do arbítrio instaurado no país, e buscava afirmar sua independência e autonomia. Os prepostos do regime, não podendo assumir-lhe o controle direto, desenvolviam a estratégia de tolher-lhe os passos, impedir-lhe ou dificultar-lhe a expansão, asfixiá-la, se possível. Era, então, praticamente impossível obter apoios internos substanciais (locais, regionais ou nacionais) para impulsionar com a necessária consistência o projeto assumido, apenas respaldado na sólida coesão institucional (professores, alunos e funcionários).

Foi justamente nesse contexto de dificuldades e incertezas que chegou até nós, qual pomba da esperança, o pastor Dressel, representando a Obra Ecumênica de Estudos, entidade da Igreja Evangélica, da Alemanha, e anunciando a possibilidade de podermos contar com um apoio do exterior.
Graças ao pastor Dressel e seus colegas da ÕSW, firmou-se um convênio entre as duas instituições, que começou a operacionalizar-se a partir de 1972. A ÕSW passou a conceder bolsas de Pós-Graduação a professores indicados pela Fidene, e por ela aprovados, em cursos a serem realizados, quer no Brasil, quer no exterior. Os professores selecionados e contemplados com bolsa da ÖSW assumiam o compromisso moral de, uma vez concluído o respectivo curso, integrar-se efetivamente à Fidene, a fim de ajudar a impulsionar a expansão do seu projeto, esperando-se deles, também, que se engajassem em atividades e ações de promoção humana junto às distintas camadas da população, com prioridade para o desenvolvimento do cooperativismo e associativismo em geral.

Pode-se ‘afirmar, com toda a segurança, que a solidariedade e o apoio, vindos da Obra Ecumênica de Estudos e da dedicação do pastor Dressel, foram fundamentais ao sonho e à ousadia na afirmação de um núcleo de reflexão científica e crítica, no distante ponto do tempo e do espaço da história do ensino superior brasileiro, no Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. A Obra Ecumênica de Estudos ocupa um lugar importante na história do ensino superior da região. Nos arquivos da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí) e na memória de seus integran tes, está registrada essa cooperação que daria suporte, por muitos anos, inclusive até hoje, à formação de docentes. Tanto a Obra Ecumênica quanto o pastor Dressel revelam em suas políticas e ações práticas que o desenvolvimento de uma sociedade passa pelo reconhecimento das diversidades e diferenças, pela solidariedade e cooperação decorrentes dessa compreensão do mundo da vida.

Agora, pela senda dessa história de cooperação e amizade, Heinz E Dressel retorna, por meio de diferentes textos, aprofundando o diálogo com todos aqueles que se reconhecem, de alguma forma, em um desses ideais de ecumenismo e convivialidade humana. Dressel se faz presente no cenário da reflexão sobre a sociedade humana, das relações culturais, políticas e econômicas, por intermédio da escrita, tendo como pano de fundo a sua vasta experiência de quem buscou construir pontes entre diferentes visões de mundo e de culturas, ao longo de boa parte de sua vida.

O Os temas escolhidos pelo autor e a elaboração dos textos refletem uma história devida, brotam da trajetória de vida do autor. Revelam os seus caminhos de pastor, de observador e pesquisador, marcados pela palavra falada ou pela escrita. O autor busca comunicar-se, pelos seus textos, a partir de sua experiência de vida. Busca a interlocução, o diálogo, entre pessoas e povos. E, ao fazê-lo, enriquece as relações entre as diferentes culturas e visões de mundo, entre as diversas práticas sociais de convivência humana.

No primeiro texto retorna ao seu núcleo de formação inicial, o campo da teologia, aceitando um diálogo com quem busca entender a problemática da religião. O diálogo se estabelece com um aluno do curso de Sociologia da Unijuí, que busca como tema de conclusão de seus estudos a identidade religiosa da juventude de hoje. O texto é uma excelente reflexão sobre a questão religiosa, que continua a ser uma das grandes questões da vida do ser humano.

O texto sobre o problema da terra e da reforma agrária, no Brasil, além da importância do texto em si, revela muito da vida do autor. Buscar compreender e solidarizar-se com a problemática brasileira sempre foi uma forte motivação para ele. Além disso, o texto da pesquisa sobre a problemática da terra é uma significativa contribuição ao debate histórico da reforma agrária, no Brasil, especialmente considerando-se que o autor manteve muitos relacionamentos pessoais com políticos e lideranças brasileiras, voltadas à questão. Como tal, constitui-se em texto inédito.
Por fim, porém não em ordem cronológica, o autor trata de uma problemática pouco conhecida, certamente, do leitor brasileiro: a Alemanha nazista e o comportamento de distintos setores da Igreja Protestante no período do governo nazista. O texto é resultado de pesquisas e estudos realizados pelo autor, apresentados em eventos e seminários específicos. O autor oferece ao leitor brasileiro uma rara oportunidade de conhecer aspectos importantes dessa problemática histórica.

Os textos são uma importante contribuição à discussão de diferentes problemáticas, seja do campo da cultura, da economia, da política ou da religião, a desafiar, especialmente, os povos dos países periféricos ou aqueles que sonham com dias melhores para todos. Os diferentes textos devem ser lidos tendo como referência a rica experiência de seu autor, que vai do campo teológico à área da educação, passando pela convivência com complexas e diferentes culturas, ao longo de algumas décadas. Os textos revelam a capacidade de pesquisa e de observação de quem soube aliar diferentes funções em seu lugar de trabalho. Mostram a capacidade do olhar de quem sabe produzir conhecimentos, pela observação crítica do mundo, aliando visões de cultura, de política e de economia. Os textos, portanto, oferecem ao leitor uma excelente oportunidade de interlocução com alguém que vem de uma outra cultura e realidade socioeconômica. Na leitura dos textos está presente uma ponte entre pessoas e culturas. O diálogo de diferentes olhares permite, com certeza, leituras mais significativas e completas de uma realidade.

Professor Walter Frantz Doutor em Sociologia

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